Estreia a seção SEMILOAD, um crossover da Popload com a incrível newsletter Semibreve, de Dora Guerra. Vamos começar falando do futuro das guitarras?

Estreia a seção SEMILOAD, um crossover da Popload com a incrível newsletter Semibreve, de Dora Guerra. Vamos começar falando do futuro das guitarras? Foto: divulgação

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* A Popload orgulhosamente anuncia o começo de uma parceria com a newsletter “Semibreve”, sensacional espaço pop de conversas musicais criado pela talentosíssima Dora Guerra, de Belo Horizonte. A newsletter de Dora tem 1 anos de vida, ela tem 22 e a Popload tem 20. Estreamos como “coluna virtual” no site da Folha de S.Pauo dois anos depois de a Dora nascer, pensa.

E é isso que a gente quer. Olhar fresh para quem já viveu várias ondas na música. Se ela não entende o que aconteceu, a gente explica. Se a gente não entender o que está acontecendo, ela explica. E assim vamos.

Vamos deixar a Dora falar. Ou melhor, escrever. Porque ela escreve muito. Na quantidade e principalmente na qualidade.

Nosso primeiro assunto, que pautou esta estreia e antes a Semibreve dela desta semana, foi o papo que tivemos sobre a questão da guitarra ser cool de novo, quando a gente nem tinha ideia que ela não era mais faz tempo, apesar de estarmos ligados na consequência do fenômeno kpop e em menor escala o do jpop. E de o mercado de shows da Ásia ter diminuído bastante o convite a bandas de rock americanas e inglesas.

Enfim, assunto para a Dora analisar. A gente adora a Dora analisando.

Bem-vinde à SEMILOAD.

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“Quando dois fãs de música notam a mesma coisa, é coincidência ou tendência?

Foi assim que a “Semibreve” encontrou a Popload – falando de guitarras. E foi assim que eu encontrei o Lúcio Ribeiro: quando ele reparou na leve Van-Halen-zação de Megan Thee Stallion, vimos que tinha coisa aí. Agora, começamos nossa parceria palpitando sobre o futuro.

É dezembro, ou seja, o futuro é daqui a um mês: com vacina ou sem, a gente tenta se segurar no que a gente consegue prever. E como bem sabemos, música pop/mainstream tende a ser um negócio cíclico, abandonando padrões e embarcando em outros clássicos. Às vezes, prever o futuro é meio apostar no passado.

Eu sou da turma da galera de 20 e poucos anos que se formou à base de tudo que passava no TVZ em 2008 – nessa época, pop tinha um quê de pop rock; emo era o que há; indie era bem indie rock. De tanto ouvir riff de guitarra em mp3 ilegal, o ouvido cansa. E não é à toa que, poucos anos depois, a guitarra rocker foi sumindo.

Tempos depois, habitamos em um momento em que rock ficou praticamente brega (adjetivo), um conceito desatualizado – feito por e somente para os roqueiros de sempre. O estilo musical que eu sempre adorei e tomei por garantido, indie rock, me parece ter perdido a parte “rock” e se tornado uma outra espécie de música, para quem se atualizou – os Strokes continuam na mesma, mas por isso mesmo parecem parados no tempo (Me desculpa, Julian querido, mas é verdade). Com o mix Neo-Soul/R&B que tomou conta, a guitarra foi de rocker a funky; mais tímida ou swinguenta que gritante e rasgada.

Bom, chegamos a 2020 e, do ponto de vista do pop internacional – que, queiram os críticos ou não, dita a moda –, o ciclo parece estar virando e as guitarras, saindo do coma e tomando a linha de frente. Muito inspirado pela seção alternativa, o pop vem flertando até com o nu-metal: com a doida da Poppy, passando pela doida da Grimes e, quando a gente assusta, tem nu-metal até no SAWAYAMA, o álbum da Sawayama. Foi uma grata surpresa para todos nós, convenhamos.

Tem outras flexões: Fine Line passeou e até trouxe She, ainda muito ancorado em um rock nostálgico. A Miley Cyrus veio com o que me soou um pouco como um rock Disney, mas é guitarrudo como nada mais foi no pop deste ano (tiveram guitarras cá e lá nas tendências disco, mas sempre pendendo mais a Nile Rodgers que a Jimi Hendrix; e deixando o protagonismo para o contrabaixo, o que eu nunca reclamei).

Na real, a guitarra guitarruda roqueira está mostrando sinais de vida desde 2019, mas eu estava na dúvida se ela estava ressuscitando de vez ou só dando últimos respiros. Eu não amo a Halsey, mas adoro quando ela flerta com seu lado mais pesado; o sucesso de Machine Gun Kelly – cujas músicas e vídeos vieram literalmente de 2009 – e YUNGBLUD terminam de nos lembrar de que o emo não morreu (é a onda My Chemical Romance e Fall Out Boy, em novas embalagens).

E, ao meu ver, já orbitamos em (e seguimos caminhando para) extremos: um deles sendo a quebradeira, especialmente eletrônica. Há algo de muito rock’n’roll nisso: um desapego completo por regras, estética arrumadinha ou ordem de qualquer tipo. E, em tempos de excesso de informação, excessos visuais e sonoros, a galera do hyperpop – que anda cada dia mais mainstream – entra de cabeça: mais é mais é mais é mais. Daí, incorporar a guitarra-barulhêra no meio da hipersaturação imagética parece quaaaaase natural.

Mas nem tudo é necessariamente uma escolha estética: a imprensa publicou um estudo há um tempo atrás afirmando que as compras de violão e guitarra aumentaram muito neste ano, o que faz sentido. Em quarentena, a geração que está começando agora enquanto musicista teve que se conformar com os instrumentos mais acessíveis e populares. Junta isso com o que os novinhos mais dão conta de fazer em casa: brincar com softwares de produção. Tem algo mais “futuro da música” que um bando de jovem em quarentena?

Com essas pinceladas, aceitei que o retorno da guitarra – enquanto protagonista cheia de riffs e o negócio todo – já é realidade para o ano que vem, segundo eu mesma (e a Popload, que parece achar que eu sei o que tô falando).

Até aqui tudo lindo, mas tem um ponto importante: a guitarra não cai bem quando caricata – foi essa a dificuldade que eu tive com o novo da Miley Cyrus, que leva sua proposta tão a sério que não pareceu inovar em nada. Curiosamente, foi o próprio Mark Ronson quem me ensinou: “Você não pode sequestrar nostalgia em atacado – tem que acrescentar algo de novo a isso”. Atacado ou varejo, acho que o rock anos 80 não é a chave para o futuro.

Porque quando a guitarra é a estética, soa como um retrato muito copiado e colado de uma era que acabamos de viver – ou uma que não queremos recuperar. O que não significa que a guitarra não possa chutar a porta da frente.

Fato é: é difícil fazer a guitarra riffuda e barulhenta soar como algo novo. Para além do hyperpop, nu-metal e outras variantes, talvez ela seja mais bem usada pelas verdadeiras rockstars de hoje: as mulheres pretas. Afinal – não pensei que eu diria isso em 2020 – rap e rock pode ser um bom combo; Doja Cat vem anunciando isso também.

E já imaginou a Cardi B com uma guitarra? Eu animo ver.”

** Dora Guerra (@goraduerra) é a cara-metade da seção SEMILOAD e edita semanalmente a newsletter “Semibreve”, distribuída por email, às quartas-feiras. Assine aqui para receber. E, depois, se você quiser ver as anteriores, é só mandar um email para a Dora que ela libera.

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Postado por Lucio Ribeiro   dia 04/12/2020
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