Eles são jovens, irreverentes e conectados. Não fazem música para agradar ninguém além de si mesmos, e você vai ficar tão viciado quanto estamos desde a primeira audição de “Contato”, o terceiro disco da banda paulistana Pelados, lançado nesta semana pelo selo Risco.
A banda, formada por Manu Julian, Helena Cruz, Vicente Tassara, Theo Ceccato e Lauiz, está na ativa desde 2016 e já passou por muitas transmutações.
Tanto que é um ponto de discórdia o fato deste ser o terceiro álbum do grupo, como explicou o guitarrista Vicente para a Popload: “A gente tem um grande segredo: esse pode ser tanto o nosso segundo disco, quanto o nosso terceiro disco, quanto o nosso quinto disco. Porque a banda se formou de um jeito e depois se reformulou. Então, nessa brincadeira toda, no fundo, a gente não sabe qual o disco que é e não importa. A gente sempre começa de novo”.
Como completou Lauiz, responsável pelos sintetizadores e os “computadores” da banda, o direcional coletivo para a Pelados é claro: “A única regra que a gente não quebra é que, sempre que entramos no estúdio, a gente tenta fazer uma música boa”.
“Contato”, este da capa acima, é um ótimo exemplo de quando uma regra funciona para a música, um álbum de 14 faixas que se complementam em um experimento que une ciência e arte.
Em uma primeira audição, principalmente para aqueles que já acompanhavam o trabalho da banda, “Contato” pode soar como uma ruptura ou algo muito diferente do que a Pelados tinha feito antes.
Se você olhar só para a Pelados como uma banda, talvez seja interessante que nós sejamos os cientistas e olhemos com um microscópio para cada integrante e os projetos que cada um desenvolve.
A vocalista Manu Julian acabou de lançar “Sentimental”, seu primeiro projeto em carreira solo. Theo e Vicente são também metade da banda Sophia Chablau e uma Enorme Perda de Tempo. Helena Cruz é dessas ótimas baixistas que artistas como Sessa e Ale Sater chamam para suas gigs. E Lauiz lançou seu terceiro álbum solo, “Perigo Imediato”, no ano passado.
Essa variedade de projetos abre espaço para que cada membro da banda tenha múltiplas oportunidades de tocar e realmente se estabelecer como artista, e Lauiz ainda foi além, dizendo “Tudo que faço fora da Pelados é estudando para quando eu me juntar com a Pelados”.
Então vale escutar o disco levando em consideração esses projetos e as referências que a galera da banda levou ao estúdio.
O quinteto construiu junto um repertório de inspirações, que vão desde “Brat”, de Charli XCX, que ganhou uma referência direta na faixa “Boy, So Confusing (Lauiz e Doutor Smirnoff Enfrentam Seus Fantasmas no Planeta XCX)”, passando pelo indie rock dos anos 2000 do LCD Soundsystem, um pouco da psicodelia bizarra dos Flaming Lips. Tudo misturado a uma dose saudável de Rita Lee, Mutantes e Gilberto Gil dos anos 1970.
A vocalista, Manu Julian explicou como a banda levou essas referências para o estúdio. “Quando gravamos, a gente assume muito o lugar de produtores e esse foi um disco em que fomos mais sistemáticos. No “Foi Mal” (2022), por exemplo, a gente gravou música por música. O que é um pouco ingênuo, para não usar outra palavra”.
Sobre o álbum novo, efetivamente, que começa já dando o tom do projeto, a Pelados começa “Contato” com uma declaração polêmica: “Vamos acabar com a MPB”. Tal qual “Foi Mal”, que iniciava falando sobre a decaptação do Sgt. Pepper, dos Beatles. Ou Peppers, como está no título do primeiro disco da Pelados.
As músicas são eletrônicas, mas não são só digitais, e Manu explicou muito desse racional de trazer mais elementos do pop para as canções.
“Quisemos trazer para o ‘Contato’ essa coisa que é mais explorada por produtores da Charli XCX ou por outros projetos que nos interessaram muito nestes últimos tempos […] que são justamente essas referências de você leva para a plataforma do computador e se propõe a fazer um pop muito intenso […]. É justamente essa mistura com o pop maluco que tem no 100 Gecs, na Charli XCX, no Mundo Vídeo, que também é uma banda nacional que está indo por esse caminho. Misturado com referências mais tradicionais.”
A segunda faixa do disco, “Planeta Oxxo”, sintetiza todo esse processo. Para fazer a música, Lauiz disse à Popload que a banda tinha uma pasta online “que ficou meses cheia de ideias que não tinham letra, ou letras que não tinham base, e elas iam meio reagindo, umas coisas ficavam lá esquecidas, algumas ainda devem estar lá, e o Felipe Vaqueiro foi chamado exatamente porque ele era um cara que podia pegar uma dessas ideias que a gente sabia que eram boas”.
Então as referências foram sendo fermentadas ali naquela conexão que só a internet permite, para ir evoluindo no estúdio.
Ao longo do álbum, para além dessas referências e de criticar grandes multinacionais, a banda também faz uma alusão a elementos cósmicos e de sci-fi, especialmente nas faixas que encerram o disco “Star Trek: o Primeiro Contato” e “Instruções para Descongelar Gilberto Gil no Espaço”.
Nesta conersa com a Popload, séries como “Arquivo X” também foram mencionadas, principalmente pelo baterista, Theo Ceccato, que reforçou o ponto de o disco ser menos digital. E uma frase que nos deixou com um alerta: “Este disco é uma mentira”, recebida por um coro de confirmações de seus colegas de banda.
Tal frase específica reforça os pontos da narrativa audiovisual que a banda está criando nas redes, e nossa sensação é que o lançamento do disco em si é só o começo. Estamos aqui ansiosos para ver one a Pelados vai parar com este “Contato”. E além.
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* As fotos deste post e a do destaque da home são de Gabriela Luiza.