Sonic Youth está de volta, mas não exatamente do jeito que a gente gostaria (ainda)

Está ficando bom demais essa história de o Pedro Antunes escrever textos massa para a Popload aos sábados. Fora que, hoje em dia envolvido em trazer bandas legais ao Brasil, é sempre bom imaginar uma relação com o que o jornalista musical (sim!, repetimos) escreve e o que ele anda tramando para os próximos festivais. Ainda que essas bandas nem existam mais, tipo o… Sonic Youth.

Por Pedro Antunes

A gigantesca banda indie americana Sonic Youth segue aposentada, distante e desunida, mas alimentando os fãs de fragmentos de uma esperança ruidosa e guitarrística aqui e acolá.

A novidade é o petardo “Live in Brooklyn, Ny”, lançado nesta sexta-feira, um registro ao vivo gravado em agosto de 2011, com 85 minutos de um grupo que vivia seus últimos momentos sobre os palcos deste mundão.

Esta apresentação histórica é chamada pelos fãs do Hemisfério Norte de “The Last Show”, o que não passa de uma incoerência transformada em licença-poética-imperialista por não se tratar do verdadeiro ÚLTIMO show do grupo. 

Como sabemos, este aconteceu em terras brasileiras, na inóspita Paulínia, cidade que por um breve período mais de uma década atrás tentou se tornar um polo cultural brasileiro, com incentivo ao cinema e à música. Mas falo deste show mais para frente. 

“Live in Brooklyn, Ny” é uma lembrança de um tempo que não existe mais, infelizmente, de uma banda que rompia com estéticas enquanto transformava ruído em poesia. Sonic Youth criava uma parede de som reverberante amparada por letras espertas, semidadaístas e existencialistas. Os Youth faziam a gente questionar, constantemente, qualquer status quo, principalmente os musicais. 

Sim, uma doideira. 

O registro deste show no Brooklyn, é claro, tem um sabor especial por ser um “jogo em casa” da banda, diante de um público quente, ao anoitecer. 

Seria como se Lionel Messi fizesse um jogo de despedida em pleno Camp Nou, estádio do Barcelona, mas depois decidisse jogar mais algumas partidas em outro continente, saca? 

O setlist do show, com 17 músicas, várias delas havia muito tempo não tocadas pelo grupo, foi bolado pelo baterista Steve Shelley como uma espécie de provocação com o restante do grupo. E foi incendiário – a gravação mostra como a banda ainda tinha lenha pra queimar. 

E ainda tem… Será? 

Já circularam rumores de uma possível reunião do grupo. Ouvi um que parecia quentíssimo, mas a história esfriou mais uma vez com os anúncios de planos de cada um dos integrantes. 

Kim Gordon segue lançando música com o projeto Body/Head, que passou por São Paulo em 2016. 

Desde o fim da banda, aliás, Kim publicou o visceral e necessário livro “A Garota da Banda: Uma Autobiografia” (com edição brasileira publicada pela Fábrica231 e traduzido pelo Alexandre Matias, do “Trabalho Sujo”), no qual ela revive seu contato com arte e música, além do nascimento e morte da sua banda e do casamento com Thurston Moore.

Moore também anunciou uma autobiografia, “Sonic Life”, livro previsto para chegar às prateleiras em outubro, e tem mais um disco solo vindo aí. 

Já o guitarrista Lee Ranaldo e o baterista Steve Shelley têm uma relação intrínseca com o Brasil e é possível que, vez ou outra, você encontre com eles pela Santa Cecília ou Vila Madalena. 

Ranaldo, em uma prolífica carreira solo, esteve constantemente no Brasil, principalmente nos anos pré-pandemia, para apresentar seus discos e projetos especiais (devo tê-lo entrevistado um par de vezes, pelo menos, para o “Estadão” e “Rolling Stone”). 

Shelley, por exemplo, tocou no Bar Alto com a Riviera Gaz, o bacanérrimo projeto de Gustavo Riviera (vocalista e guitarrista do Forgotten Boys) com Paulo Kishimoto (baixista da banda da cantora Pitty), nesta semana. Quem foi deve estar com zunido no ouvido até agora.

A sensação de ouvir “Live in Brooklyn, Ny” é totalmente diferente da lembrança do último show de verdade do grupo, em São Paulo, três meses depois naquele 2011. Em Nova York, o fim ainda não parecia tão próximo e a banda soa mais divertida e leve. 

São várias interações com o público entre uma música e outra. Divirta-se com a furiosa “Sacred Trickster”, na qual Kim Gordon ironiza a pergunta “Como é ser a garota da banda?”, ou com o “hit” “Sugar Kane”, com várias aspas por se tratar do Youth, né? 

Já no palco de Paulínia, o último da turnê sul-americana, o fim era palpável, como se fosse um fantasma que se materializava no palco erguido no interior de São Paulo e estivesse ao lado da banda também. 

Eu estava lá (e tenho a camiseta da banda comprada naquele dia gasta pelo tempo para provar). 

Era um 14 de novembro, a terceira e última do noite do festival SWU, realizada em Paulínia pela única vez, encabeçada por Megadeth, Stone Temple Pilots, Alice in Chains e Faith No More.

A última vez em que Thurston Moore e Lee Ranaldo deixaram suas guitarras encostadas nos amplificadores gigantes montados atrás de si e os ruídos encobriram as palmas e gritos (tímidos) do público na saída da banda de cena após uma versão fulminante de “Teen Age Riot”.

Uma despedida melancólica pela chuva que caia com maior ou menor intensidade daquele dia, mas também por um público que não reagia tão intensamente à impressionante parede sonora criada pelo quinteto (além dos quatro integrantes, o baixista Mark Ibold, do Pavement, se juntara ao grupo em 2006 nos últimos seis anos de banda). 

Naquela altura, sabia-se que a banda estava à beira do fim, mas não era uma certeza. Um mês antes do último show (e depois do registro de Nova York lançado agora), Kim Gordon se separara de Thurston Moore após 27 anos de casamento diante de um caso de infidelidade do guitarrista. 

Foi somente uma semana depois da performance no SWU que Lee Ranaldo avisou que a banda daria um tempo. 

E a gente segue esperando. 

Aqui você pode assistir ao verdadeiro último show do grupo no player abaixo: 

* Aqui, o setlist do show de Paulínia (SP)

Sonic Youth Setlist SWU Festival 2011, 2011 South American Tour
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