Top 50 da CENA – Deekapz sai em busca do amor. Com Criolo e Marky. E o Paira leva o mar para BH. E o Jonas Sá fecha o pódio sentindo

Duas duplas formam o topo do nosso top. Diferentes entre si, talvez exista alguma conexão entre Deekapz e Paira no quanto buscam nas batidas eletrônicas do passado as respostas para o seu tempo e som. Por falar em passado, Skylab foi aos jornais dos anos 80 recuperar um poema “pornográfico” e polêmico. E isso é só um pouco do que compõem mais um Top 50 da CENA. 

A dupla produtora Matheus Henrique e Paulo Vitor que forma o Deekapz já tinha um dos hits do ano nas mãos: a música “Só Quero Ver”, presente no álbum do rapper BK. Se você acompanha o nosso Top 10 Gringo, sabe também que eles estão no discaço da Amaarae. Não satisfeitos, o Deekapz resolveu soltar seu disco próprio, onde os produtores simulam uma transmissão de rádio FM e os convidados chiquetosos soltam a voz: Fat Family, Criolo, Tuyo, Gab Ferreira, Nego Bala, Nill, Jamés Venturas e grande elenco. “Deekapz FM” tem direito até a vinhetinhas e os chiados de uma transmissão radiofônica. Nostálgico demais. A faixa do Marky com o Criolo nos leva a 1997, drum’n’bass clássico. Tudo bem bonito.

“Eu faço tudo por você/ Eu faço tudo/ Tudo/ Tudo/ Por você”
Essa vontade toda, quase exasperada, expressa na letra de Vinícius Cabral, é bem traduzida na pancada sonora pela dupla mineira Paira, formada por André Pádua e Clara Borges, no que talvez seja sua faixa mais barulhenta até aqui. Entre gritos e sussurros, “Ao Mar” é uma das boas peças de “EP02”, segundo coleção de músicas do duo, que se alterna entre voz, guitarra e bateria – apenas o baixo tem uma contribuição externa com a participação de Roberto Kramer.

Atrás de uma sonoridade especial, Jonas Sá reuniu um time de feras (Alberto Continentino no baixo acústico, Donatinho no piano, Marcelo Callado na bateria, Thomas Harres e Pedro Fontes nas percussões e Thiago Nassif no dobro e violão de aço) para gravar um instrumental ao vivo no estúdio. Porém, diante de duas sessões ao vivo onde o som da bateria agradou na primeira e o resto do instrumental só na segunda, Jonas resolveu colar a bateria da primeira sessão na segunda – um desafio, já que o tempo dos registros ficou ligeiramente diferente. É essa ida ao jeito mais clássico de se gravar combinado com um rearranjo eletrônico na mix que garante a espacialidade no que Jonas chama de “folk-blues ácido”. É de tirar o chão do ouvinte mesmo, flutuar no espaço vazio. 

Gostamos muito do Supervão ao vivo. Ou eles não teriam tocado no Popload Festival e em uma das edições do Circuito. A banda em nova fase com a chegada de Rafaela Both (bateria) e Olímpio Machado (baixo e vocais) desde o excelente “Amores e Vícios da Geração Nostalgia” (do ano passado) resolveu salvar esse período e vai lançar um EP com registros ao vivo recentes, “AVGN”. A primeira mostra do trabalho fica na favorita dos fãs, “Tudo Certo para Dar Errado”. Dividida em duas partes no álbum, ela fica juntinha aqui de maneira inédita. 

Embora esteja entre um dos “26 Poetas Hoje”, a antologia de 1976 organizada por Heloísa Teixeira e hoje um clássico da literatura brasileira, pouca gente lembra de Roberto Schwarz como versador. Mas ele versa e em 1985 o crítico literário causou no Folhetim, antigo caderno da Folha de S.Paulo, com a publicação do poema “Mão no Pau”. Com o processo de redemocratização em andamento, o texto rendeu até abaixo-assinado pedindo que o jornal retomasse a seriedade. Uns 40 anos se passaram e o texto caiu como luva na voz de Rogério Skylab. É a faixa de abertura do primeiro volume da “Trilogia da Putrefação”, disco que também conta com participação da nossa poploader Claro Bicho, que está em todas. 

Se o rock brasileiro deixou de ser mainstream, parte do problema é sua crise criativa. E na conta dessa falta de imaginação pouco se fala de problemas estruturais como racismo e classicismo. “O rock não é um gênero para o negro”, disse Seu Jorge há dez anos e muita gente fez questão de não entender sua frase. Ele estava falando do gênero no Brasil, sempre muito branco, sempre ou quase sempre muito rico. Mateus Fazeno Rock encarou a questão. Cresceu amando as bandas de rock que ouvia no rádio e na TV e achou que não era para ele aquilo. Resolveu confrontar, resolveu ser mais que um artista, ser um processo coletivo – Fazeno Rock é mais que Mateus. Em seu terceiro álbum, “Lá na Zárea Todos Querem Viver Bem”, esse processo se solidifica ao trazer a melhor sonoridade possível para suas ideias. As limitações de orçamento e equipamentos já não limitam as ideias. E aí Mateus esbanja o que o rock pode ser no Brasil. E pode ser muito mais que lamúrias de adultos mimados e reclamões. 

“Você, um susto que eu gosto.” Como escrever uma canção de amor sem dizer “Eu te amo” e sem soar piegas? O Pelados faz isso na estranha “Estranho Efeito” e sua forma toda desconjuntada e charmosa de ser, da batida meio quebrada sobrepondo tudo até a voz quase sussurrando a letra. A música está em “Contato”, próximo álbum da banda formada por Lauiz, Vicente Tassara, Helena Cruz, Theo Ceccato e Manu Julian. Já ouvimos e olha, a listinha de melhores do ano tem novidade.

Cícero é dos muitos artistas que viram um punhado de ideias se perderem com a pandemia. Seu álbum “Cosmo”, lançado justamente em março de 2020, não teve sorte. Do baque veio seu maior tempo em silêncio desde sua estreia. As pancadas e belezas da vida agora aparecem em um conjunto bonito chamado “Uma Onda em Pedaços”, talvez o álbum onde Cícero mais bem equilibre seu lado violãozinho com uma faceta mais interessada em experimentações minimalistas (até rap tem no disco!). 

Foi uma baita sacada quando a Rihanna simplesmente pegou a base de “New Person, Same Old Mistakes”, do grupo indie australiano Tame Impala, e meteu a própria voz. E lá se vão quase dez anos do ótimo “ANTI”. A “nossa” Duda Beat fez agora uma versão brasileira desse evento ao pegar a base da sexy “Foi Mal”, do Boogarins, e colocar a voz dela no EP “Esse Delírio”.

Sendo um pouco crítico demais, dá para dizer que o rock brasileiro, especialmente a partir dos anos 1970 e 1980, aprendeu a falar português abdicando um pouco do que de mais torto tem na sonoridade do rock feito em inglês. Um truque, em especial, foi deixar sempre a voz muito acima do instrumental. Com o tempo, essas limitações foram sendo quebradas, soluções foram encontradas. Mesmo assim, nos anos 1990, para dialogar com o indie rock barulhento de Sonic Youth e cia, muitas bandas brasileiras voltaram ao inglês para dar encaixe. No caso de Eliminadorzinho, que tem seu nome inspirado em uma música dos Youth, essa barreira do idioma parece nunca ter existido. O artista conecta perfeitamente a barulheira noise com letras em bom português, resolvendo uma questão fonética de décadas. Ouça e ateste. 

11 – Lau e Eu – “O Sonho de Minele…” (7)
12 – Rashid – “Conversas Que Nunca Tivemos” (8)
13 – Cida Moreira e Rodrigo Vellozo – “Velocidade da Luz” (9)
14 – Bike – “Sucuri” (10)
15 – Joca – “BADU & 3000” (com Ebony) (11)
16 – Marabu – “Rubato” (12)
17 – DO PRADO – “Um Dia de Sol” (13)
18 – Berlim do Pará – “Dias por Ardor” (14)
19 – AMANDONA! – “Se Eu Soubesse Como” (com Letrux) (15)
20 – Crizin da Z.O. – “Fatal” (com Edgar) (16)
21 – Mahmundi – “Macia Bahia” (17)
22 – YMA – “2001” (18)
23 – Ogoin e Linguini – “Sorte de Amor” (19)
24 – Rico Dalasam – “Dilema” (20)
25 – Walfredo em Busca da Simbiose – “Iridescência” (21)
26 – Clara Lima – “PHD” (22)
27 – Don L – “Iminência Parda” (23)
28 – Lupe de Lupe – “Vermelho (Seus Olhos Brilhanto Violentamente Sob os Meus)” (24)
29 – Joyce Moreno – “Um Abraço no João” (com Jards Macalé) (25)
30 – Luedji Luna – “Bonita” (com Alaíde Costa e Kato Change) (27)
31 – Joaquim – “Emboscada” (29)
32 – Zé Ibarra – “Segredo” (30)
33 – Jadsa – “Samba pra Juçara” (31)
34 – Mateus Aleluia – “No Amor Não Mando” (32)
35 – Antropoceno – “Queda do Céu” (34)
36 – clara bicho – “Meu Quarto” (36)
37 – Stefanie – “Fugir Não Adianta” (com Mahmundi) (37)
38 – Maré Tardia – “Ian Curtis” (38)
39 – Vera Fischer Era Clubber – “Lololove U” (39)  
40 – Josyara – “Eu Gosto Assim” (40)
41 – Rael – “Onda (Citação A Onda) (com Mano Brown e Dom Filó) (41)
42 – Cajupitanga e Arthus Fochi – “Flamengo” (42)
43 – Jovens Ateus – “Mágoas – Dirty Mix + Slowed Reverb” (43)
44 – Terraplana – “Todo Dia” (44)
45 – Apeles – “Mandrião (Vida e Obra)” (45)
46 – ÀIYÉ e Juan De Vitrola – “De Nuevo Saudade” (46)
47 – Dadá Joãozinho – “As Coisas” (com Jadidi) (47)
48 – Gabriel Ventura – “Fogos” (48)
49 – Nyron Higor – “São Só Palavras” (49)
50 – BK – “Só Quero Ver” (50)

***

* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, o duo dance paulista Deekpaz .
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro Vinícius Felix.

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