Gente, desculpe qualquer coisa. É que a gente tava ali chorando um pouquinho emocionado ouvindo o novo do Teago Oliveira. E isso depois de se acabar de dançar com as novidades da Urias e do João Parahyba enquanto pensávamos se seria possível ir para a China com a Tulipa Ruiz. Nossa mente é complexa. Vagueia. Mas pode confiar nas dicas musicais, aí é jogo ganho.
“Eu gosto de poesia. De som, textura, timbre, take inteiro. Eu gosto de persistir até acertar”, escreveu Teago Oliveira em seu Instagram na apresentação do seu mais novo disco, “Canções do Velho Mundo”. Esse texto esperto dele poderia muito bem ser a nossa resenha todinha, de tão certeiro. “Meus pais são pessoas humildes. Tenho medo do futuro. Do futuro da arte. Do meu futuro com a arte. Do futuro dos meus amigos. Já pensei em largar tudo. Ter uma vida normal”, confessou com a mesma sinceridade de suas canções apresentadas no álbum. Canções, realmente, ô jeito antigo de se fazer música, né? O que não aparece no texto de Teago, talvez por modéstia da parte dele, é que ele também gosta de fazer a gente se emocionar, outra coisa super fora de moda. É do inexplicável como a gente fica com vontade de chorar em “Desencontros, Despedidas”, uma coleção de pequenas fotografias em versos registrando seus amigos e amores (“Ana entrou na minha porta e pra sempre ficou” é sua parceria de vida, Ana Paula Bohnenberger/ ”O vento passou para Luquinha, Léo e Didi” são os colegas de Maglore). A coisa é tão envolvente, tão delicada, que vem a lembrança de “Encontros e Despedidas do Milton”, vêm lembranças dos Carnavais todos, de cada mudança de casa, da escola, de jogar bola na rua. Pô, parece que o Teago era um amigo nosso daquela época. Se pá, era mesmo. Certeza que era.
Quando encarou o memético questionamento “Cultura Livre por Urias”, ela devolveu: “É passar nossa história de geração em geração sem medo”. Dito e feito. “Carranca” é a história de Urias. História que ela já vinha contando, é verdade, desde sua estreia superpop em “Fúrias” e passando pelo seu álbum “gringo” “Her Mind”, mas tava na cara que sua solução era o Brasil. Falar em português, festejar em português, se aproximar do rap. Pensar no passado, presente e futuro de um país tão alegre e tão violento. Tão diverso culturalmente e tão cruel com a população trans. Não por acaso, o encerramento do álbum é “Voz do Brasil. Porque ela quer ser ouvida por todo mundo, quer poder circular em liberdade e paz. “Eu também quero ir pro Brasil”, são os versos de encerramento de quem quer mais do país e sabe que ele pode oferecer muito mais. Ainda há uma democracia a ser construída por aqui. Uma que alcance todos mesmo.
Apesar do Trio Mocotó seguir fervendo pelo Brasil em sua nova formação, com Melvin Santhana chegando após a partida do mestre Skowa, João Parahyba andava quieto em termos de carrerira solo havia 14 anos. “Xei Lá Town”, com esse “s” com som de “x” à la Jorge Ben, é o tema instrumental que antecipa a volta em álbum de inéditas previsto para este fim de mês. Misturando samba rock com jazz e outras sonoridades, ele formou uma banda com Jotap Barbosa (saxofone), Fernando César (piano), Cléber Almeida (bateria), Giba da Silva Pinto (baixo) e Rafael Kabelo e nomeou a confusão de “Mangundi”, segundo ele um termo do Vale do Paraíba para descrever mistura inusitadas. Nunca tínhamos ouvido esse termo, mas de mistura inusitada e boa do João sabíamos bem. Pode confiar.
O nosso soft power ainda não é igual ao sul-coreano, mas vamos à luta. Quer ver? Em 2020, Tulipa Ruiz foi até a China para uma uma residência artística com a artista Yehaiyahan, fruto de uma parceria do projeto China Tropical com a Embaixada do Brasil em Pequim. O rolê aconteceu em uma fazenda em Lijiang, província de Yunnan, sudoeste da China. Com o material filmado por lá por Filipe Franco e com as músicas compostas também naquele período, finalmente o material em esquema bilíngue foi para o mundo – e vamos combinar, com o estado do Brasil em 2020 + pandemia, valeu esperar… Agora Tulipa completa seu papel diplomático com uma turnê pela China, além de representar o Brasil no Fórum de Artes de Liangzhu. Aliás, se o Itamaraty quiser dicas de outros nomes para fortalecer, temos uma CENA para cada embaixada desse mundão.Temos um Brasil tão foda para mostrar, lembram do Gil tocando na ONU? O mundo tem um jeito que nós podemos dar.
Enquanto os bancões lutam contra o trabalho online, Marisa Monte ainda acredita no modelo. “Sua Onda” foi gravada em conexão entre três cidades bem distantes uma da outra. Marisa no Rio, o produtor argentino Gustavo Santaolalla em L.A e a Budapest Scoring Orchestra em Budapeste, lógico. Escrita com seus parceiros de sempre, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, a música é a inédita escolhida por ela para sua turnê com orquestra, Phonica. Gravar a faixa com Santaolalla, vencedor do Oscar pelas trilhas de “Brokeback Mountain” e “Babel”, é reencontrar um velho amigo. Em 2009, o argentino trouxe seu projeto Café de los Maestros, uma banda que reúne a velha guarda do tango local, e convidou Marisa para cantar junto. Pouco tempo depois, seria dele o violão na faixa “Ainda Bem”. Por enquanto, é uma colaboraçãozinha, mas será que não cabe um disco nessa amizade entre hermanos?
“Sou a perfeição e a minha inimiga é a pressa”, versa Tracie na faixa-título do primeiro álbum dela com sua irmã Tasha, “Serena & Venus”. É o verso de rap perfeito: arrogante, objetivo, sagaz e, a parte mais difícil de todas, verdadeiro. Se tivessem pressa, Tasha & Tracie teriam sumido de cena há dez anos, quando começaram a chamar atenção como blogueiras de moda no “Expensive $hit”, site que elas alimentavam sem ter internet em casa. Ou, talvez, logo depois do excelente EP “Diretoria”, lançado em 2021. Mas elas sabem navegar. Souberam construir sua imagem antes de fazer música e sabem expandir a fama depois de boas músicas lançadas. Colaborações, trampos de publicidade, capa da “Capricho” e a maior agenda de shows do rap nacional deram a base para que o primeiro álbum delas fosse feito no estúdio delas da maneira delas. O perfeccionismo e o cuidado aparecem antes do play: são 21 faixas em um álbum conceitual sobre a vivência de uma mulher no sistema prisional, da ascensão à queda. Uma história muito inspirada na história pessoal das meninas – a mãe delas esteve um tempo presa. Como a comunicação com a mãe se dava por meio de cartas, são elas que guiam parte da lírica até a estética da capa. As cartas que as irmãs queimaram de tanta tristeza pela barra da situação se tornam seu veículo, seja para passar a visão da situação da cadeia quando se é mulher ou ainda para mostrar como ter um carreira de sucesso na música nos anos 20. Nos streamings, o nome do disco é completado com um “(Lado A)”. Sendo assim, teremos um lado B? Coisas boas nos aguardam, parece.
Talvez todo artista quando forma amizade com outro mande aquele papo “E se a gente fizer um disco nosso, hein?”. Se a dupla tiver uma banda, então, a probabilidade sobe graças ao volume de composições pelo caminho, ideias que não cabem no grupo. Entre seus mil projetos, a dupla de amigos Sophia Chablau & Felipe Vaqueiro chegou na tal questão. Mas, diferentemente de milhares de outros, eles tocaram o projeto em frente. Foram para o estúdio, chamaram outros colegas para ajudar (e os amigos são simplesmente Marcelo Cabral e Biel Basile) e boa. “Handycam” é o registro do rolê. Como indica o nome, esse registro em uma câmera barata, capturando o calor do momento em baixa resolução. É tudo tão espontâneo que o disquinho tem mil caminhos: eles cantam juntos, cantam separados, cantam coisas escritas em dupla e coisas escritas só por um ou por outro. Mas nessas tantas trilhas eles se encontram mil vezes. O genocídio na Palestina é um tema caro aos dois: “Quando as bombas matam gente estadunidense vemos no jornal/ Mas se é gente inocente longe do ocidente do norte global/ Se amansam as manchetes”, escreve Felipe. “Tudo está em guerra/ me pergunto como esse mar tão azul/ continua banhando a Terra”, escreve Sophia. O amor também aparece como tema comum: “E eu beijaria o set inteiro, só pra disfarçar/ gosto de você pra caralho”, confessa ela na caetânica “Cinema Brasileiro”. “Tenho muito a aprender, pois com você parece ter/ Um jeitinho de fazer acontecer”, diz ele em “Já Não Me Sinto Tão Só”, faixa que é uma espécie de encontro de Geraldo Azevedo com Mac DeMarco. Não são os dias mais fáceis, mas com a ajuda dos amigos é isso aí, uma canção pode salvar o dia. Cuidemos de fazer canções aos montes, então.
Outro encontro de amigos que foi para frente é o do duo carioca Mundo Video (Gael Sonkin e Vitor Terra) com o niteroiense Dadá Joãozinho. “Dourado” é a primeiro adianto de um EP do encontro. No formato apresentado até aqui, o Mundo Video dá a cama sonora para Dadá versar ao seu modo, rimas em flash rápidos, clipes de uma cena, aberto a mil interpretações. Ele já vinha dando essa guinada para deixar sua voz mais forte, mais presente. É pop esquisitaço e apaixonado do melhor.
A banda punk de um homem só voltou mais provocativa do que nunca em “Nada Nunca Jamais”. Estilhaçando ainda mais seu mix de punk com música eletrônica, o mineiro Luis Henrique despeja suas ideias sem meias palavras, seja para bater nos alternativos nada alternativos ou na postura genocida do estado de Israel. Quem vê tosquice nas suas produções não sabe de seu passado remixado trap e do seu empenho em encontrar esse som de rock produzindo tudo em um notebook. É coisa de geniozinho mesmo. Uma história ótima é de quando aos 16 anos ele chamou atenção do rapper Isaiah Rashad com seus remixes piratas de trap. O cara chamou ele para trabalhar junto, mas Pusher estava de castigo, sem computador e perdeu o bonde. “Nada Nunca Jamais” ficou um tempão fora das plataformas de streaming, mas agora já está em todas. Bora.
Jup do Bairro lança em outubro seu primeiro álbum de estúdio, “Juízo Final”. E se o primeiro single, a melancólica “A Gente Vive Menos Que uma Sacola Plástica”, dava poucas pistas do que viria por aí, é com “E SE NÃO FOSSE O SONHO” que começamos a entender um pouco melhor a pancada preparada pela artista. Dentro de uma base de funk bem clássica e animada ela versa sobre o sonho ser seu motor. Era acreditar ou não voltar. Agora é refletir e rebolar.
11 – LAN & Bebé – “(Des)conectar” (7)
12 – Oruã – “Casual” (8)
13 – Djavan – “Um Brinde” (9)
14 – Douglas Germano – “Tudo É Samba” (10)
15 – Eliminadorzinho – “Você Me Deixa Coisado” (11)
16 – Rodrigo Ogi e niLL – “Doze Badaladas” (12)
17 – Vanguart – “Estação Liberdade” (13)
18 – Sessa – “Vale a Pena” (14)
19 – Tori – “Ilha Úmida” (15)
20 – Bike – “Essência Real” (16)
21 – Gab Ferreira – “Seu Olhar” (17)
22 – Fleezus – “Pace de Malandro” (18)
23 – Valentim Frateschi – “Mau Contato” (com Sophia Chablau) (19)
24 – Chico César – “Breu” (20)
25 – Supervão – “Love e Vício Em Sunshine (Ao Vivo)” (21)
26 – Bella e o Olmo da Bruxa – “Deus, Gay” (22)
27 – Pelados – “Whatsapp 2” (23)
28 – Nina Maia – “Manha” (24)
29 – Janine Mathias – “Um Minuto” (25)
30 – Mateus Fazeno Rock – “O Braseiro e as Estrelas” (28)
31 – Joca – “BADU & 3000” (com Ebony) (29)
32 – Marabu – “Rubato” (30)
33 – Crizin da Z.O. – “Fatal” (com Edgar) (31)
34 – Don L – “Iminência Parda” (33)
35 – Lupe de Lupe – “Vermelho (Seus Olhos Brilhanto Violentamente Sob os Meus)” (34)
36 – Luedji Luna – “Bonita” (com Alaíde Costa e Kato Change) (35)
37 – Zé Ibarra – “Segredo” (36)
38 – Jadsa – “Samba pra Juçara” (37)
39 – Mateus Aleluia – “No Amor Não Mando” (38)
40 – Stefanie – “Fugir Não Adianta” (com Mahmundi) (39)
41 – Vera Fischer Era Clubber – “Lololove U” (41)
42 – Josyara – “Eu Gosto Assim” (42)
43 – Cajupitanga e Arthus Fochi – “Flamengo” (43)
44 – Terraplana – “Todo Dia” (44)
45 – Apeles – “Mandrião (Vida e Obra)” (45)
46 – ÀIYÉ e Juan De Vitrola – “De Nuevo Saudade” (46)
47 – Dadá Joãozinho – “As Coisas” (com Jadidi) (47)
48 – Gabriel Ventura – “Fogos” (48)
49 – Nyron Higor – “São Só Palavras” (49)
50 – BK – “Só Quero Ver” (50)
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* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, o músico brasileiro Teago Oliveira, sob foto de Lucas Azevedo.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.