Top 50 da CENA – Don L, Flora Matos e Anitta dominam a semana, bem dominada. A ponto de deixarmos a Céu fora do pódio (mas ela volta)

Semana para altas filosofias e metáforas. Novidades do Don L, Flora Matos, Anitta, Céu… Só peso pesado. E ainda trazemos o Trago, uma novidade na música brasileira que promete. Uma banda transmídia. Atenção para o refrão: temos a melhor música do mundo. Exaltemos.

Don L sabe de algo que também sabemos, só não conseguimos ainda colocar em palavras. Mas, sorte a nossa, ele sabe. O rapper de Fortal tem a manha de bater a chapa de nossa fraturada e esquisita realidade. Só que isso não significa um texto direto e reto. Ele precisa ser mais e mais poético para alcançar o inalcançável – em contrapartida, exige de nós um tiquinho mais de atenção. O que soa incômodo no fim de cada dia nosso? Que ânsia é essa pelo futuro enquanto perdemos o presente – às vezes diante de tudo que sonhamos (ou sonharam para a gente?). É, Caetano, nós também não sabemos bem a razão, mas nos sentimos um pouco mais tristes do que antes. A boa night de Don L rende um insight – e ele puxa uma angústia, como já escreveu Fernando Sabino. Cabe a nós analisar ou não. E, tudo bem, tem dias que é melhor nem pensar. Para mais camadas: visite o vídeo da música que dialoga com cinema mudo e com a fotografia de Claudia Andujar. 

Lançar uma música é uma coisa trabalhosa. Envolve muita gente. Até um som chegar ao seu ouvido, acredite, dezenas de pessoas trabalharam naquilo diretamente ou indiretamente. Fora a música em si, depois de pronta é preciso press release, textos, posts, vish, muita coisa. Para um artista lançar na boa um som sem mais explicações e ainda assim alcançar seus ouvintes é necessário cruzar uma forte arrebentação. O mar é tão nervoso que às vezes até nomes muito populares não dão conta. É questão de momento. E Flora Matos está neste lugar hoje. Soltou “Inventei o Seu Jeito de Amar” sem dizer mais nada. Tudo está na música. Nesta semana, ela escreveu no seu Instagram que vem álbum novo aí – assim, ainda cheia de mistério.

Quando Anitta era jovem de tudo, seu mp3 player no colégio ficava entre o indie  – amava Strokes – e o emo – amava Fresno. Também tinha tempo para curtir o Bonde do Rolê e sua bagaceira funk bacanuda. Corta para 2024, quando ela tem a chance de pedir para o bonde do Gorky, uma das mentes por trás do Bonde, uma música que lembrasse sua antiga banda. O resultado é “Grip”, que tem a mistura que fez o grupo de Curitiba ficar famoso: funk + melodias bem humoradas + guitarras distorcidas bem podreiras. Só faltou uma letra mais sacana…

Céu não poderia encontrar um nome que representasse mais o Brasil do que “Novela”. Mas talvez a metáfora aí seja menos com o Brasil e mais com a textura e velocidade de produção proposta no álbum. Menos eletrônico que os anteriores – fora ser o primeiro trampo autoral após um disco acústico e um de releituras -, “Novela” representa um “back to basics”, gravado em esquema quase ao vivo com banda, sem muito espaço para elaboração – ritmo de gravação de uma novela televisiva, que pode  ser exibida e funciona até em baixa resolução, como a capa do disco. É Céu em discurso direto, sem rodeios.

Trago seria uma banda? Seria mais que isso? É que o Trago, projeto que reúne Tulipa Ruiz, Gustavo Ruiz, Rica Amabis e Alexandre Orion, trabalha música, artes visuais e realidade na mesma medida – o que pode ser chamado de projeto transmídia. O novo single da turma é um relato da rotina do trabalhador – e faz valer a tese do geógrafo Milton Santos: são as camadas mais pobres da sociedade que enxergam a realidade como de fato é. É o trabalhador que entende mesmo como o mundo (des)funciona – não é por acaso que virá dele a (re)solução.

Depois de deixar a gente arrepiado com a poderosa “Oração 18”, uma de suas muitas orações, Luiza Brina resgatou “Oração 2”, já lançada lá em 2017. Se a versão original era levada de maneira acústica com violão, percussão e sopros, a versão 2024 tanto respeita o arranjo original quanto dá uma acelerada leve na música e traz uma numerosa orquestra para dar um brilho extra. Além disso, a música agora é um dueto com participação especial da mexicana Silvana Estrada. A história de como a dupla se formou é curiosa. Luiza descobriu que elas se admiravam mutuamente em segredo. Quando Silvana colou no Brasil para tocar, foi o momento de papear e transformar admiração em boa amizade.

Somos fãs de músicas que têm diversos momentos, como se fossem quase diversas canções de tão diferentes que são algumas partes. E “Tudo Acontece Agora PT. 1”, novo álbum da turma d’O Grilo, é cheio desses momentos. Um dos exemplos é a bem-humorada “Manual Prático do Tédio”, uma ode à preguiça, ao deixar para depois. “Contar mentiras, meias verdades/ Reagendar os meus alarmes/ Não acordar”. Para que pressa? A solução é só uma questão de tempo.

Falar aqui, a gente ficou meio pensativo com a entrevista que a Duda Beat deu ao “G1”. Bateu na gente uma vontade de implorar para ela não se comparar tanto com outros nomes do pop nacional. Ela relata na entrevista que sente a pressão por números e tal e nossa dica é: desapega disso. Chega a dar arrepio ver artista falando em flop de música. Qué isso? Uma música não é menos legal ou importante porque menos gente ouviu. Você já faz a parte mais difícil que são as músicas boas – essas sim sempre em falta no panteão que bomba, convenhamos. Então, a gente fica na torcida para que a Duda sofra menos com esse falso espelho que são as redes sociais. Não é simples, mas essa é a nossa forma de dizer que estamos aqui pela música legal e pela música feita de coração. E, pô, “Tara e Tal”, novo álbum da Duda, é cheio desses momentos. E esta “q prazer”? Delícia de som.

Em meio século de carreira, a paraibana Cátia de França foi acumulando um séquito de seguidores fiéis. Se não lançou tantos discos, nem apareceu tanto na mídia quanto contemporâneos seus como Elba Ramalho, Zé Ramalho e Xangai, ela teve o tempo e a curiosidade de gerações a seu favor, em especial pelo seu álbum “Vinte Palavras ao Redor do Sol”, o favorito de cada um que tem a sorte de descobrir essa joia do final dos anos 1970. Setentona agora é ela, e com fôlego de menina em seu novo trabalho, “No Rastro de Catarina”. Só ver a porrada psicodélica nordestina que é “Fênix”, que fala justamente de conseguir renascer em múltiplos sentidos, inclusive profissionalmente. Cátia, inclusive, dedica este som aos fãs que a redescobriram viram internet. “Quando estou em cima do palco e olho para vocês, jovens, muitos que nem eram nascidos em 1979, tenho uma sensação maravilhosa de realmente as coisas fazerem sentido como nunca antes”, anotou a cantora.

Unindo sonoridades com um toque de soul brasileiro oitentista que lembra coisas até de Tim Maia, com um toquezinho de samba também, Rodrigo Mancusi faz um gostoso som. Daquelas músicas quentes, até sem medo de ser um tiquinho brega na hora de se derramar na declaração apaixonada. Consequências dolorosas de noites boas.

11 – Papisa – “Fronteira” (7)
12 – Varanda – “Vá e Não Volte” (8)
13 – Taxidermia – “Clarão Azul” (9)
14 – Mirela Hazin – “Delírio” (10)
15 – Inocentes – “São Paulo (Acústico)” (11)
16 – Bruno Berle – “Te Amar Eterno” (12)
17 – Fresno – “Quando o Pesadelo Acabar” (13)
18 – Pabllo Vittar – “Pra Te Esquecer” (14)
20 – Tuyo – “Devagar” (15)
21 – Irmãs de Pau – “Megatron” (16)
22 – FBC – “Atmosfera” – Ao Vivo (17)
23 – Sonhos Tomam Conta – “Uma Súplica” (18)
24 – Sabotage, Don L e Luedji Luna  – “Dama Tereza” (19)
25 – Tom Zé – “Jesus Floresta Amazônica” / ”Danilo Constelação” (20)
26 – Malu Maria – “A Língua Trava” (21)
27 – Haroldo Bontempo – “Risada (com João Donato)” (22)
28 – Tássia Reis – “Mais Que Refrão (com Rashid)” (23)
29 – Jota Ghetto – “Michael B. Jordan na Fila do CAT” (24)
30 – Deize Tigrona – “25 de Abril (com Boogarins)” (25)
31 – Jujuliete –  “Dominatrix” (26)
32 – Apeles – “In God’s Hands” (27)
33 – Juçara Marçal e DJ Ramemes – “Ladra – Remix” (29)
34 – Amaro Freitas – “Viva Naná” (30)
35 – Sofia Freire – “Autofagia” (31)
36 – Carne Doce – “Cererê” (32)
37 – Kamau – “Documentário” (34)
38 – Josyara – “Ralé/Mimar Você” (35)
39 – Maria Maud – “02.02” (37)
40 – Madre – “Sirenes” (38)
41 – Raidol – “Imensidão” (40)
42 – Rodrigo Campos – “Gamei” (41)
43 – Chinaina – “Roubaram Minha Jóia” (42)
44 – Dead Fish – “11 de Setembro” (43)
45 – Vandal – Violah (44)
46 – Clara Bicho – “Luzes da Cidade” (45)
47 – Parteum – “’12 6 10” (46)
48 – GRIYÖ – “Afropenobeat” (48)
49 – Rico Dalasam – “Jovinho” (49)
50 – Ogoin & Linguini – “Quando Tudo Começou” (50)


***
* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, o rapper Don L, em foto de Larroza.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.

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