Top 50 da CENA – Resgatando a grande Carolina Maria de Jesus. O coração bifurcado leva Jards Macalé ao segundo posto. Rodrigo Campos atraca em terceiro

É um presente que em 2023 possamos colocar em primeiro lugar do top 50 da CENA uma de nossas maiores escritoras – que também fez música e agora tem sua obra revisitada em um belo álbum editado pelo selo Sesc. Não bobeia. A resposta tem que ser sim quando te perguntarem se você já leu ou escutou Carolina Maria de Jesus. Bob Dylan é mato. Uma pena que o Nobel chegou atrasado nessa questão, mais uma vez. 

A mineira Carolina Maria de Jesus foi uma das maiores escritoras da literatura brasileira. “Quarto de Despejo”, best-seller na época do seu lançamento, em 1960, e um sucesso até hoje, é leitura obrigatória. De escrita particular, criadora e moderna, Carolina, que morreu em 1977 aos 63 anos, não escreveu só livros. Também fez canções e gravou parte do seu material após o encanto de sua estreia literária. “Bitita – As Composições de Carolina Maria de Jesus” é a regravação desse álbum lançado nos anos 1960. Com diferentes vozes, a produção e direção musical de Sthe Araújo, integrante d’A Espetacular Charanga do França e da Funmilayo Afrobeat Orquestra recria o que Carolina escreveu e cantou. Na frente das gravações, se destacam as letras de Carolina, que vão do incisivo, como na crítica “O Pobre e o Rico”, ao reflexivo, caso de “Quem Assim Me Vê Cantando”, e a percussão, colocada em primeiro plano nas músicas. Preciosidade.

Jards Macalé não é só o mais novo oitentão da praça. Ele, que comemorou seu aniversário agora no começo do mês, também celebra sua música programando um álbum de inéditas para abril. Vai ser um disco de amor – amor enquanto gesto político, explica Macalé. Aquele amor para tirar o ódio do caminho na política de cada dia. O single novo é uma parceira com Kiko Dinnuci. A letra é de Kiko e a música de Jards:  “O mote é a famosa cantiga de Pombagira: ‘Um amor faz sofrer, dois amô faz chorar’. Vemos um coração na encruzilhada, diante das possibilidades de decisão entre dois amores e a total solidão”, conta o músico. Na banda que gravou a música (guitarra, baixo, bateria e cavaco), esse cavaco é tocado por Rodrigo Campos, nosso terceiro colocado desta semana… 

Para anunciar “Pagode Novo”, seu novo trabalho, Rodrigo Campos posou ao lado de duas coisas fundamentais para ele: “Canções Praieiras”, de Dorival Caymmi, e do celular.  Um é o disco que tanto já conversou com a obra do paulistano; o outro é objeto onde ele construiu seu novo disco. Passado e futuro dialogando. Pagode Novo é um movimento, tipo Cinema Novo, sabe? É “busca filosófica intensa, mas em direção ao silêncio”, como escreve Rodrigo. Um jogo de contrastes. Tem mil participações, mas é pandêmico, feito em casa em isolamento. É manifesto, mas Campos avisa: “No estatuto do Pagode Novo, as páginas estão em branco”. Pois é. Para lá e para cá, vai e vem. O balanço de Campos, de Caymmi ou de um pagode – de um pagode novo.

Em seu novo álbum, duplo e com gosto de uma variada playlist de música brasileira, Rubel aprontou quase um festival. Olhe a lista de participações especiais, que tem para todos os gostos: Tim Bernardes, Xande de Pilares, Bala Desejo, BK, Gabriel do Borel, Mc Carol, Deekapz, Luedji Luna. A gente compraria esse ingresso tranquilo, se isso fosse um line-up de festival. E, nessa divertida brincadeira, o headliner é o recém-aposentado dos palcos Milton Nascimento. “Lua de Garrafa”, escrita por Rubel e Milton, que dividem os vocais aqui, é uma daquelas bonitas músicas sobre amizade e sobre como é tirar o peso da vida quando compartilhamos canções, filmes, abraços e também despedidas – Jules e Jim. Ah, vale mergulhar na super resenha que nossa poploader Lina Andreosi fez aqui na Popload.

Aos pouquinhos, Assucena vai montando sua carreira solo. Seja cantando seu material, seja interpretando canções de outros compositores. Já apresentou dois singles que devem estar presentes em sua estreia, com produção de Pupillo e a direção artística da cantora Céu. Até aqui tudo nota dez. Nas suas composições brilha a junção de sua escrita muito particular com sua voz poderosa. Mistura flagrada a cada sílaba cantada. Dando diversos tons de luzes, sombras e sentido aos versos. O quarto à meia luz de “Nu” tem tudo isso. É uma canção sobre sexo: “A nudez como o tempero de desejos que se reconhecem possíveis”, explica Assucena.

A gente curte muito o som do cantor paulistano todo bossa Sessa. Inclusive, ansiosos para o show dele no Bar Alto lá em maio – já se programe – oportunidade única antes de ele ir mostrar seu som aos europeus. Ano passado, Sessa lançou o belo “Estrela Acesa”, mas não encontrou espaço para o calmo mantra “Vento a Favor”. Aí ele resolveu lançar a música como single, agora: “Eu achei que ela tinha uma onda um pouco diferente do resto do disco. Não deixa de ser uma onda muito boa também então, pô”, escreveu. Tá certo, pô. 

Patrimônio da música independente paulistana, o duo musical-artístico Tetine, formado nos anos 90 por Bruno Verner e Eliete Mejorado, vive hoje em Londres e de lá arma um novo futuro, agora em trio, com a entrada da violoncelista Yoko Afi, jovem de tudo.  “Spaced out in Paradise” é o primeiro representante de “After the Future”, álbum que chega no fim deste mês. Dream pop gringo genuíno, porém abrasileirado. Esta aqui, por enquanto, só no Youtube.

Aqui o maior exemplo de que o ano começa depois do Carnaval. A mineira Marina Sena esperou a Quarta-Feira de Cinzas ficar no passado para soltar o primeiro single do seu segundo álbum, que promete ser uma jornada sobre sua temporada paulista. Sem férias desde que bombou com a estreia solo, “De Primeira”, Marina faz sutis mudanças sonoras e visuais para a nova fase, agora apoiada por uma grande gravadora. Mas o crescimento não afastou ela das companhias de sempre: seu parceiro Iuri Rio Branco continua firme na produção, por exemplo. Quem gostou do balanço do primeiro álbum vai curtir a frequência meio pop/meio tropical da nova música, que chega a saudar Caetano em “De Noite na Cama”. Uma música para noites quentes de verão. Quentura climática e/ou corporal, digamos. Mestrona das redes sociais, Marina também já garantiu qual será a dancinha de “Tudo pra Amar Você” – uma coreografia entre o debochado e sexy. Tem tudo para pegar você.  

Outra que esperou a folia acabar foi a MC Tha, que preparou uma letra especial para o dia seguinte dos rolês carnavalescos, especialmente se te aconteceu algum daqueles encontros/desencontros que pesam no coraçãozinho da nublada Quarta de Cinzas. “Dois corpos se encontram em uma noite de Carnaval e seguem rasgando a manhã juntos. Sem saber ao certo no que vai dar, os enamorados aproveitam o embalo do mar e de tudo o que resta até a festa terminar”, é o texto que acompanha a música no YouTube. Coisa linda essa música. Viciante. 

Rolou uma decepção coletiva quando saiu “Cracker Island”, o novo disco do Gorillaz, e nada da esperada participação do brasileiro MC Bin Laden, feita quando Damon Albarn veio ao país para alguns shows, no ano passado. Onde estaria a gravação? Ela veio agora na edição de luxo do álbum. Uma track envolvente onde Bin Landen nem é “featuring”, praticamente. O homem é o destaque rimando em português o tempo todo, com Albarn só pontuando num refrãozinho malandro. Desculpa aí, Gorillaz, mas esta é nossa. Vai, Brasil, ho ho ha ha. 

11 – Bike – “O Torto Santo” (4)
12 – Alcione – “Acorda Que Eu Quero Ver” (5)
13 – Terraplana – “Memórias” (6)
14 – Pabllo Vittar – AMEIANOITE (com Glória Groove) (7) 
15 – Mateus Fazeno Rock – “Melô da Aparecida” (8)
16 – Tagua Tagua – “Pra Trás” (9)
17 – Nina Maia & Chica Barreto – “Gosto Meio Doce” (10) 
18 – Chico César – “Ligue o Foda-se” (11)
19 – Sant – “Nuvem Negra” (12)
20 – Gustavo Bertoni – “Marionettes” (13)
21 – Tim Bernardes – “Modinha” (14)
22 – Danilo Cutrim – “Vai Cair” (15)
23 – Maria Beraldo – “Truco” (16)
24 – Jonathan Ferr – “Preterida” (17)
25 – Mu540 – “Jatada Nostálgica Automotiva” (18)
26 – Jup do Bairro – JUP ME” (19)
27 – Betina – “O Coração Batendo no Corpo Todo” (com Luiza Lian) (20)
28 – Karen Jonz e CSS – “Coocoocrazy (com CSS) (22) 
29 – 2DE1 – “Sin Perder La Ternura Jamás” (23)
30 – Sara Não Tem Nome – “Agora” (24) 
31 – ÀIYÉ – “Onda” (25)
32 – Letrux – “Esse Filme Que Passou Foi Bom” (26)
33 – Marcelo D2 – “POVO . DE . FÉ” (27)
34 – Lurdez da Luz – “Devastada” (28)
35 – Kamau – “DoisTrês” (29)
36 – Anelis Assumpção – “Rasta” (com Mahmundi) (30) 
37 – Funmilayo Afrobeat Orquestra – “Wikipreta” (com Monna Brutal) (31)
38 – TUM – “Polychrome” (32)
39 – JP – “Arroz de Polvo (com Holger)” (33)
40 – Wry – “Carta às Moscas” (34)
41 – Tássia Reis – “Rude” (35)
42 – Der Baum – “I Got a Soul” (36)
43 – Marina Gasolina – “Looking Through The K-Hole” (37)
44 – Luedji Luna – “Blue” (38) 
45 – Rincon Sapiência – “MAGIA” (com Menor MC) (39) 
46 – Rashid – “Linha de Frente” (com Amiri e Don L) (41) 
47 – Cidade Dormitório – “Aribé I” (42)
48 – BK – “Continuação de um Sonho” (43)
49 – Mundhumano – “Guerreiras Urbanas” (com Conceição e Flávia Carolina) (44)
50 – Sulamericana – “Dia Bom” (49)

***
* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, a mineira Carolina Maria de Jesus.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.

MITSKI – horizontal miolo página
MITSKI – inner fixed
Editora Terreno Estranho – inner fixed mobile