Top 50 da CENA – Sara Não Tem Nome vai ao topo agora. Lucas Santtana emplaca seu paraíso em segundo. A nova onda da ÀYIÉ fecha o pódio

São só quatro novidades no ranking desta semana, mas, poxa vida, são AS NOVIDADES. Enquanto a CENA ainda engrena no ano novo, temos já pelo menos quatro músicas fortes, que te pegam no contrapé e te deixam pensando por algumas horas. Falamos disso semana passada, a CENA brasileira anda mais devagar que a internacional, questões práticas – mas a nossa força está em cada canção. 

O primeiro álbum da mineira Sara Não Tem Nome saiu no distante 2015. Durante aquele ano, o Brasil já mergulhava em um caos político dos quais hoje sabemos bem os resultados. Ainda assim, era um tempo relativamente mais ameno. Após o golpe que derrubou Dilma Rousseff e dos anos durezas com Bolsonaro no poder, Sara ficou mais reclusa artisticamente como cantora solo e investiu em outros projetos pontuais, muitos fora da música. Simbólico que sua segunda jornada solo saia junto com o florescer da nova possibilidade da democracia. Não por acaso, “A Situação” é um disco que reflete muito sobre esse intervalo de tempo. Sua capa é colorida, mas seus temas trafegam entre os escombros do autoritarismo recente. O mercado, a inércia social, os “cidadãos de bem” são alguns dos tópicos. A perspectiva oferecida por Sara escapa nas entrelinhas, nos chamando a atenção em tempos dispersos. Aprendemos com nossos erros? 

Outro músico ligado nos tempos atuais, Lucas Santtana reflete em “O Paraíso”  sobre as questões ambientais que ameaçam acabar com o nosso planetinha. Se os multibilionários com seus multibilhões almejam Marte, Lucas avisa que o paraíso já é aqui – temos tudo nesTe planeta. Pensar mais onde estamos e o que nos separa de entender isso e de alcançar isso. Igual a Sara, Lucas entende que a uma resposta para essa questão na experiência coletiva. 

Com o Carnaval chegando, uma onda corretíssima é deitar nesse samba-reggae da Larrissa Conforto com seu projeto ÀIYÉ. Bem-humorada, a música contém uma piada interna de Larissa com as amigas. “Desligar o projetor é um jeitinho fofo de dizer pra amiga deixar de idealizar situações e calar a boquinha de lixo da nossa mente pensante.” E é com o projetor desligado que ela encara a rua nesta música e vai curtir um poucos todas as suas possibilidades. Estado permanente de Carnaval, esse é o mantra. 

Só o título dessa música merecia um troféu de tão foda que é. Lançada no álbum “Aos Prantos”, trabalho da Letrux que saiu no dia em que o Brasil começou a se trancar em casa para escapar da pandemia, a faixa se renova com um poderoso vídeo. É intenso ver dois anos depois como uma música que reflete sobre a morte e consequentemente sobre a vida conversa tão fortemente com o período posterior ao seu lançamento. Letrux sabe das coisas. 

Após colocar o Planet Hemp de novo na praça, Marcelo D2 já anuncia uma nova fase em sua carreira solo. “Vem aí um disco novo de ‘afro samba digital’, como diz o Criolo”, anunciou o rapper. “POVO . DE . FÉ”, escrita com o professor, escritor, poeta e compositor Luiz Antônio Simas, é o bom prenúncio, com seu instrumental de samba superclássico trazendo um colorido do rap no acabamento. Na eterna procura da batida perfeita, D2 parece ter achado uma nova dosagem da mistura, dificultando mais saber de onde veio o quê. Fresco, ancestral e futurista. Trocando em miúdos, muito foda, viu?

Em um levada de forró com um delicioso acento nos graves, Lurdez da Luz levanta uma pergunta: “Você também já se sentiu, assim, devastada?”. O segredo está na continuação da pergunta: “Mas se refez do nada?” Todo bom brasileiro vai dizer que sim. De olho no íntimo e no público, Lurdez analisa esse relacionamento abusivo e joga luz no que se perde e no que precisamos mirar para sair dessa. “Agora temos a possibilidade de retomar um bom projeto de país, mas vale lembrar que metade da população está amarrada na máquina fake e essa é uma triste realidade para o Brasil”, escreve a artista.  

Em uma faixa rápida para abrir os trabalhos de 2023, Kamau entrega um beat sinuoso em uma letra que deixa a gente tortinho das ideias. “Fui além do que eu podia por menos do que eu mereço” é só um dos muitos versos da canção que fintam a gente, bom driblador das adversidades que é o rapper paulista.

Essa foi uma que deixamos passar em 22. O rapper Sant fez um dos refrões mais viciantes do ano e que desce em ritmo alucinado na produção de LP Beatzz, artilheiros igual Bebeto e Romário mesmo: “Desde menor sei o valor dessas notas
E o que elas fizeram com a mente da tropa
Tento mudar isso de dentro pra fora
Ando descalço aonde tu não brota”

E, por falar em sons que deixamos passar em 2022, “Sal”, novo disco da Anelis saiu na confusão de dezembro e só agora conseguimos sacar com calma este belíssimo trabalho construído em uma forte unidades de muitos grãos, que é como o sal opera como condimento, não? Além de Mahmundi, que participa da nossa predileta, ainda temos por aqui, Céu, Jadsa, Luedji Luna, Larissa Luz, Thalma de Freitas, Dona Anicide, Josyara, Iara Rennó, Maíra Freita e Curumin. Sério, não é um festival, não, é a lista de convidados.

Só tem homem no afrobeat? Foi essa pergunta que a turma da Funmilayo Afrobeat Orquestra encarou em 2019, quando organizaram seu coletivo formado por mulheres negras e pessoas não-binárias. O nome da banda não é por acaso, Funmilayo Anikulapo Kuti, foi uma pioneira na luta por liberdade na Nigéria – com um plus, como o sobrenome entrega, ela é mãe de Fela Kuti, o pai do afrobeat. Com a emergência da pandemia, que apareceu pouco tempo depois da reunião do grupo, elas resistiram a esse longo inverno e do processo coletivo apresentam seu primeiro álbum, o maravilhoso “Funmilayo”, daqueles discos para ouvir do começo ao fim, sem pular faixas. O texto de “Wikipreta” coloca as ideias de forma objetiva: “A branquitude diz que são tempos sombrios, mas quando é que teve bom para nós, hein?/ Democracia fajuta que não escuta preto e se diz aliado quando convém”. 

11 – TUM – “Polychrome” (7)
12 – JP – “Arroz de Polvo (com Holger)” (8)
13 – Wry – “Carta às Moscas” (9)
14 – Tássia Reis – “Rude” (10)
15 – Der Baum – “I Got a Soul” (11)
16 – Marina Gasolina – “Looking through the K-Hole” (12)
17 – Luedji Luna – “Blue” (13)
18 – Assucena – “Menino Pele Cor de Jambo” (14) 
19 – Rincon Sapiência – “MAGIA” (com Menor MC) (16) 
20 – Rashid – “Linha de Frente” (com Amiri e Don L) (17) 
21 – Cidade Dormitório – “Aribé I” (18)
22 – BK – “Continuação de um Sonho” (19)
23 – Mundhumano – “Guerreiras Urbanas” (com Conceição e Flávia Carolina) (20)
24 – Sulamericana – “Dia Bom” (21)
25 – Gal Costa  – “Baby” (22)
26 – Dozaj – “Parede Alta Vista Curta” (23)
27 – Tuyo – “Sonho Antigo” (24)
28 – Russo Passapusso, Antônio Carlos e Jocafi – “Aperta o Pé” (25)
29 – Sci Fi – “Sixteen” (26)
30 – Planet Hemp – “Taca Fogo” (27)
31 – VHOOR – “Balinha da Alegria” (28)
32 – Pato Fu – “A Besta” (29)
33 – Lucas Santtana – “Vamos Ficar na Terra” (30)
34 –  Trupe Chá de Boldo- “Ouça Onça” (31)
35 – Gab Ferreira – “Laughing” (32)
36 – Joy Sales – “Signos Fincados” (33)
37 – Far from Alaska – “Olha (com Lenine)” (34)
38 – Djonga – “Até Sua Alma (com Tasha e Tracie) (35)
39 – Number Teddie – “Poderia Ser Pior” (36)
40 – Mestre Môa do Katendê – “Veía Coló (com Edgar e BNegão)”  (37)
41 – Janu – “Vey” (38)
42 – ÀVUÀ – “Bentivi” (39)
43 – Xênia França – “Ânimus × Anima (com Arthur Verocai)” (40)
44 – Giovanna Moraes – “Caixa de Pandora” (41)
45 – Do Amor – “Nefelibata” (42)
46 – Jup do Bairro – “Pelo Amor de Deize” (com Deize Tigrona) (43)
47 – Deize Tigrona – “Sururu das Meninas” (44)
48 – Tulipa Ruiz – “Novelos” (46)
49 – Cecilia Cecilina – “O Canto dos Sapos” (47)
50 – Vanguart – “Oceano Rubi” (48)

***
* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, a cantora mineira Sara Não Tem Nome, sob imagem de Randolpho Lamonier e Victor Galvão.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.


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