Adeus a Ozzy. Seu legado, do metal à invenção do… punk (!)

Como você gostaria que fossem seus últimos dias de vida? Que tal estar rodeado pela sua família, voltar para o lugar em que você cresceu, ser homenageado por aqueles que foram influenciados por você, se sentir amado por uma multidão e realizar pela última vez o que mais gosta de fazer na vida?

Ozzy Osbourne passou por tudo isso há 19 dias e morreu ontem, tendo feito muito mais do que ele jamais sonhou na adolescência após ouvir Beatles e resolver que era aquilo que ele queria fazer da vida. 

Ozzy nasceu e cresceu em Birmingham, Inglaterra, uma cidade industrial, ainda se recuperando do fim da Segunda Guerra. A falta de esperança e os poucos atrativos da cidade fizeram dali o berço perfeito para o som que Ozzy e seus amigos Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward fariam. Ou melhor, criariam. 

Em vários pontos de Birmingham que ligam Ozzy à cidade, fãs deixaram flores ao roqueiro, que morreu terça. Acima, Abaixo, um livro de condolências aberto ao público fã colheu assinaturas e mensagens de despedidas ao ídolo da cidade no Birmingham Museum and Art Gallery

Nada seria igual na música mundial após os primeiros segundos da canção que dá título à banda e abre seu primeiro disco homônimo. Sons de trovões e chuva introduzem o começo de Black Sabbath. A sequência é uma banda tocando um som pesado, incômodo e diferente de tudo até então. No centro disso, um vocalista que não está cantando, mas sim vivendo o terror que aquela música retrata. De 1968 até hoje, esta primeira audição ainda causa impacto. 

Pela próxima década, o grupo foi criando clássicos que se tornaram referência para grupos de heavy metal, mas não só. Músicas do Sabbath já tiveram versões de artistas que vão de Charles Bradley a Cardigans, de Cake a Flaming Lips, de Moby a Ryan Adams. Se formos colocar samples nessa contagem, aí o número fica ainda maior, com Beastie Boys, Eminem, Cypress Hill, Daft Punk, para começar. Quem do rap não sampleou fez cover, como Post Malone e Busta Rhymes.

Veja você, não é pouca gente que defende também que o eterno hit “Paranoid”, do Black Sabbath, influenciou o movimento punk, uma das grandes “polêmicas” da música. E não só porque os colossais Ramones abriram para a banda de Ozzy algumas vezes nos anos 70. Nem apenas porque o famoso grupo punk californiano The Dickies fez cover da música em 1978. “Paranoid”, para alguns, foi um verdadeiro hino proto-punk por seus riffs pesados e certeiros, pela velocidade da música e pelo vocal de Ozzy nela, bem… punk.

Tá bom de legado até aqui? 

Mas isso é só a primeira década da carreira de Ozzy. Ao sair do Sabbath, Ozzy supera sua antiga banda, que nunca mais teria o mesmo impacto sem seu vocalista original. Ozzy foi melhor e maior vocalista. E os exageros e excessos sonoros e estéticos e comportamentais dos anos 80, em várias camadas, provariam isso com histórias lendárias de causos que passam por morder morcego, arrancar cabeça de pombo, cheirar carreira de formiga e muita música boa no meio do caminho. Uma dessas canções, “Crazy Train”, virou hit de estádio em vários esportes nos EUA.

A City of Birmingham Symphony Orchestra prestou tributo a Ozzy em uma grande estação de trem da cidade, que reuniu muitos fãs do cantor. Abaixo, Ozzy, em foto tirada em Londres em 1991


Nos anos 90 Ozzy esboça sua primeira turnê de despedida. Para nossa sorte, viriam ainda mais três décadas de shows. Ozzy acabou se tornando uma figura popular para além da música, acumulando participações em filmes, séries de TV e talvez o melhor reality show da história, “The Osbournes”, mostrando o cotidiano do príncipe das trevas em família, já atingindo novos admiradores que nem conheciam direito Black Sabbath. 

Sua produção musical mais notável foi realizada nas duas primeiras décadas de carreira, mas Ozzy nunca parou de gravar e de marcar shows. Até que a saúde começou a impedi-lo de fazer o que mais gostava. Nos últimos cinco anos, Ozzy vinha enfrentando a doença de Parkinson e compromissos começaram a ser cancelados. Depois de décadas vivendo nos EUA, Ozzy voltou para a Inglaterra para se recuperar em sua terra natal. Sem forças para turnês, restava um último encontro com seus amigos, família e convidados.

No último dia 5, no já histórico evento de Birmingham, o “Back to the Beginning”, estava visível que sua saúde não era boa. Agora fica claro que esse show quase não aconteceu. Foi emocionante ver todo o esforço para fazer dois sets, um com sua banda solo e outro com seus amigos do Black Sabbath.

É inacreditável como alguém com uma vida com tantos excessos conseguiu produzir tanto por tanto tempo e ainda teve força para um último presente aos seus fãs. E para ele mesmo.

A história dessa lenda merecia uma despedida cheia de amor, como ele queria e como foi. O concerto de adeus, vários adeus, contou com gente que sem o Sabbath e Ozzy talvez nem tivessem começado uma banda.

O que os Beatles foram para Ozzy, hoje ele é pra muita gente. Após uma vida tão cheia de conquistas e loucuras, Ozzy merece descansar em paz.

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Postado por Lúcio Ribeiro   dia 24/07/2025
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