CENA – Entrevistamos o “desejável” Zé Ibarra, sobre chegar com seu novo álbum, “Afim”, aos shows ao vivo

Estamos “afim” de Zé Ibarra!

Seu disco, que chegou às plataformas em junho pelo selo Coala Records e ganhou performance ao vivo a partir de ontem à noite em SP no Sesc Pompeia, traz oito faixas que transitam entre MPB, jazz, rock progressivo e pop com uma abordagem confessional e cinematográfica.

Alternando entre composições próprias e versões de artistas contemporâneos como Maria Beraldo, Sophia Chablau e Ítalo França, “Afim” revela um Ibarra mais livre, ousado e multifacetado. Arranjos de cordas e sopros ganham destaque em faixas como “Essa Confusão”, “Transe” e “Infinito em Nós”.

Com produção musical assinada pelo próprio artista, o álbum reúne um time de colaboradores como Lucas Nunes, Jaques Morelenbaum, Frederico Heliodoro e Copacabana Horns, reforçando sua conexão com a música popular brasileira clássica e abrindo espaço para interpretações mais instintivas e provocadoras, trazendo ela para 2025.

Os shows do disco ao vivo (Zé cantou ontem em SP e se prepara para se apresentar no Rio no próximo dia 6) prometem traduzir para o palco a liberdade criativa de “Afim”, em uma performance mais performática e menos contida, como ele mesmo nos contou em entrevista que você confere abaixo. 

Popload – Depois do lançamento você começa a descobrir quem é com esse disco no mundo, né? Especialmente com os shows, de contato direto com as pessoas, que é uma parte importante do processo. No estúdio é tudo mais íntimo...
Zé Ibarra – Sim, é isso. Eu amo criar, estar no estúdio, arquitetar o plano maligno de fazer as músicas funcionarem [risos]. Mas agora vem essa outra parte, a dos shows. É uma luz diferente. E acho que vou experimentar coisas novas ao vivo: deixar o violão de lado, dançar, ir para a farra, o quanto esse disco permitir [risos].

Popload – É engraçado ver como você, a Dora Morelenbaum e a Julia Mestre estão vivendo os desdobramentos pós-Bala Desejo. Você trabalha com o Lucas Nunes desde a Dônica, banda que montaram na adolescência, e cada um de vocês tem uma identidade forte, mas ainda assim remete a algo do que foi o Bala. As performances do grupo eram artísticas, dançantes, muito festa. E agora, no seu solo, o que você imagina? Já tem banda montada?
Zé Ibarra – Então, olha que louco: a gente não está dividindo músicos. Cada um foi formando sua própria banda e estética. No meu caso, o que eu mais quero é liberdade de discurso. Minha persona de voz e violão, pós-Milton, pós-Marquês, não deixava eu ser quem sou de verdade. Eu sou sarcástico, ácido, falo besteira, palavrão… E não dava para sustentar isso com aquela imagem elevada.

Popload – Tipo a pessoa que toca com a Sílvia Pérez Cruz…
Zé Ibarra – Exatamente! Mas agora eu tô mais na pegada Sophia Chablau, sabe? Quero levar tudo que aprendi com Silvia, Milton, Dônica, todo esse virtuosismo, mas rir mais, falar besteira, me levar menos a sério. E quero dançar! No Bala quem dançava eram a Júlia e a Dora. Eu ficava preso no microfone, tocando sem parar. Agora quero explorar outras possibilidades cênicas, descobrir onde meu corpo se encaixa, qual sensação o show vai transmitir. Mistério? Festa? Emoção? Ainda não sei.

PoploadE você traz no disco músicas de outras pessoas, né? Tipo a Sophia, a Maria Beraldo, o Ítalo França. Me lembra muito a Gal. Essa coisa de experimentar outras vozes, outras roupagens, de ser uma intérprete performática.
Zé Ibarra – Total. A Dora também gravou músicas de outros compositores no disco dela. No meu caso, eu regravei mesmo. E isso veio de um lugar de libertação. Durante muito tempo, me afetou essa ideia de que o compositor é mais nobre que o intérprete. Mas, cara: João Gilberto compôs duas músicas, Gal compôs uma e Elis talvez nenhuma. Eu fui desneurotizando isso. Entendi que sou um canal, um filtro, uma potência. Posso me apropriar de outros discursos e fazer deles o meu. Talvez, só por ter cantado essas músicas, eu consiga compor outras que antes não conseguia.

Popload – E também tem esse papel de amplificar vozes como as da Sophia e da Maria, né? Com o seu arranjo, você chega a outros públicos.
Zé Ibarra – Sim. E o mais legal é que muita gente que conhecia a versão original não reconheceu a música quando ouviu a minha. Isso é muito doido. Eu sou produtor antes de qualquer coisa, e adoro reinterpretar. Às vezes penso: “Essa música devia soar de outro jeito”. E experimento. A Maria, por exemplo, é supermoderna. E eu puxei ela para os anos 50, fiz algo meio Moacir Santos. Mas o discurso dela me interessa. Tava precisando falar daquelas coisas também.

Popload – Quais outras referências você trouxe nesse disco, como produtor?
Zé Ibarra – Sou péssimo de referência direta. Não penso assim. É tudo o que ouvi na vida misturado. Tem música que parece Moacir Santos mesmo, outra que lembra Sade… É mais uma salada de estilos. E nesse disco eu também me libertei da necessidade de ser coeso. Talvez a coerência seja justamente a minha voz, que perpassa tudo.

Popload – E sua voz é super-reconhecível. Nesse disco, especialmente em “Segredo”, tem um vibrato lindo. No “Marquês, 256” [álbum de 2023], era tudo mais contido, né?
Zé Ibarra – Sim. No “Marquês” eu estava buscando a síntese, a coisa exata, sem firula. Aqui também tem essa busca, mas com mais experimentação. A faixa “Hexagrama 28” é um exemplo. “Transa” também começa com a vibe do “Marquês, 256” e termina no rock’n’roll. É um Zé diferente aparecendo.

Popload – E no Bala Desejo você fazia mais a voz de baixo, né? Sempre ali, mais escondido.
Zé Ibarra – É, a formação vocal era bem definida: Dora fazia a voz de cima, Lucas e Júlia no meio, e eu embaixo. A voz que caminhava mais, mas também a menos perceptível. E como era muito talento junto, modéstia à parte, a gente se regulava para todo mundo poder existir. Mas estava tudo lá. Só não dava pra mostrar tudo.

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* As fotos deste post e da home são de Elisa Maciel.

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Postado por Carolina Andreosi   dia 19/07/2025
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Terreno Estranho – horizontal fixo Mark Lanegan